Juristas evangélicos repudiam cancelamento de curso com temática cristã na USP

Gospel
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fonte: folha gospel

A Associação Nacional de Juristas Evangélicos (ANAJURE) emitiu uma Manifestação Pública sobre o cancelamento do curso de extensão “Parto e Espiritualidade Cristã”, que seria oferecido a enfermeiros e outros profissionais e estudantes de obstetrícia da Universidade de São Paulo (USP).

Em 16 de janeiro, a universidade cancelou o curso coordenado pela Dra. Joyce da Costa Silveira de Camargo (PhD em Ciências de Enfermagem pela Universidade do Porto), cujas aulas estavam previstas para fevereiro, com quatro encontros promovidos pela EACH (Escola de Artes, Ciências e Humanidades).

O curso propunha reflexões sobre a junção entre a espiritualidade cristã e o processo de parto em suas diferentes fases, com aulas ministradas para a atualização de profissionais da área obstétrica e enfermagem, tendo em vista a humanização do atendimento através de uma abordagem holística que busca compreender a integralidade do paciente.

Segundo comunicado, a USP declarou que o cancelamento teve como propósito “preservar a natureza pública e laica da Universidade de São Paulo”. A nota ressalta que a decisão foi tomada pela Comissão de Cultura e Extensão da Escola, entidade responsável pelas atividades de extensão na USP.

Para a ANAJURE, “tal afirmação, além de violar a carga valorativa do princípio constitucional da laicidade (art. 5º, VI, da Constituição Federal) e desrespeitar o pluralismo de ideias (art. 206, da Constituição Federal), também contradiz a conduta anterior da Universidade, que promoveu múltiplos cursos dedicados a temas de outras confissões religiosas.”

Violação à laicidade

“A proteção dos direitos fundamentais é a característica basilar do Estado Democrático de Direito, sendo as instituições do Estado e o sistema jurídico projetados para assegurar o exercício pleno e efetivo das liberdades individuais e coletivas”, diz a ANAJURE.

“No que se refere à laicidade, em termos doutrinários, esta não se concretiza, por si própria, enquanto um direito fundamental; antes, ela atua como um princípio garantidor que possibilita a devida proteção a outros direitos fundamentais, como a liberdade religiosa, a liberdade de expressão, a liberdade de cátedra, etc.”, continua.

A entidade diz que é preciso distinguir entre o modelo de laicidade adotado pela Constituição da República, também denominado de laicidade positiva ou aberta, e o laicismo restritivo vigente em países como a França.

“Este último se caracteriza pela hostilidade e perseguição às manifestações do fenômeno religioso no espaço público, buscando restringi-lo à esfera privada dos indivíduos, independentemente da confissão religiosa”, afirma.

E lembra que “a laicidade não significa descrença ou extermínio do religioso da esfera pública; antes, simboliza a abertura do espaço público para a diversidade de crenças da comunidade.”

ANAJURE afirma que o caso viola o princípio da laicidade, tal como constitucionalmente previsto.

“Ao adotar uma compreensão distorcida e excludente do conceito de laicidade, a administração da USP impediu a exploração acadêmica de uma dimensão do fenômeno religioso – a interseção entre a espiritualidade cristã e o processo de parto – fundamentada tão somente em sua rejeição à presença do discurso religioso no espaço público da Universidade de São Paulo. Desse modo, é evidente a violação à neutralidade religiosa do Estado em face da manifesta hostilidade que busca excluir o fenômeno religioso do espaço da universidade.”

Conduta discriminatória

Para os juristas evangélicos, a conduta da Universidade de São Paulo foi discriminatória.

“Questiona-se sobre a existência de possível caráter discriminatório do cancelamento do curso de extensão em ‘Espiritualidade Cristã e o Parto’. Deve-se ressaltar que esta não é a primeira ocorrência de cancelamento de eventos acadêmicos que abordam a interseção entre a fé cristã e áreas do conhecimento. Em 2014, a USP cancelou o Curso Faraday-Kuyper de Ciência, Tecnologia e Religião, que ocorreria na Escola Politécnica da USP, sob o argumento de que sua realização feriria a laicidade do Estado”, lembrou.

E continuou: “Poder-se-ia considerar o cancelamento do curso de extensão universitária, com base em objeções ideológicas laicistas, como uma ofensa à laicidade e à liberdade religiosa em sua hostilidade ao fenômeno religioso em geral. Contudo, uma consulta ao histórico da Universidade de São Paulo mostra que a promoção de cursos e atividades acerca da intersecção de áreas do conhecimento com outras religiosidades não foi vista como problemática em outras ocasiões.”

E exemplifica:

“Apenas no ano de 2023, a USP ofertou os seguintes cursos: ‘270400296 – A costura do sagrado: trajes de umbanda, candomblé e de folguedos derivados de ritos afro-brasileiros’ e ‘80402270 – Cursos de Inverno da FFLCH 2023 – Mitologia dos orixás femininos na poesia’, e No Caminho do Alabê, que aborda as manifestações musicais relacionadas ao culto dos orixás”.

A ANAJURE menciona outros cursos ofertados pela universidade que incluem as religiões budista e xintoísta.

“Ora, se o suposto caráter ‘laico’ da instituição a impede de ofertar um curso de extensão sobre espiritualidade cristã e parto, a mesma compreensão deveria ser posta em prática no que tange a outros cursos com propostas diversas de intersecção entre o ensino e a religiosidade”, questiona.

E chama o cancelamento do atual curso com referência ao cristianismo de discriminação religiosa.

A ANUJURE declarou que repudia a discriminação religiosa manifesta no cancelamento do referido curso e que “enviará ofício à USP, repudiando a medida adotada e requerendo explicações e a apuração da devida responsabilidade, bem como adotará outras medidas cabíveis diante do caso.”