POLÍTICA“O governador Gladson Cameli se reelege no primeiro turno”, prevê o ex-deputado Luiz Calixto ao fazer análise cirúrgica do momento político no Acre e Brasil
“Eu me considero um progressista, um democrata, um entusiasta do debate e tenho muito respeito pelo contraditório”. Foto: Reprodução
Jorge Natal, especial para o AcreNews
A história dos partidos políticos no Brasil é marcada por alguns períodos de negação, uma vez que nos regimes autoritários a existência destes era vista como ameaça aos governantes. Num passado recente, existia um sistema bipartidário no qual o Estado só reconhecia a existência e o funcionamento de dois partidos políticos determinados.
A abertura política, no entanto, permitiu a criação de novas agremiações e o campo de centro-esquerda, destacadamente com o PT, deu uma enorme contribuição para a consolidação da democracia, o fortalecimento das instituições e o avanço do movimento social.
O discurso progressista, centrado no papel do estado como provedor do bem-estar social e na retomada do desenvolvimento econômico, causou muitas, mas muitas expectativas, que foram frustradas com a ascensão do esquerdismo ao poder.
A decadência do establishment político fez emergir alguns novos partidos de direita, destacadamente o PSL e o Novo. Este último, apesar de sua concepção essencialmente liberal, ainda não se consolidou como partido forte e organizado. O PSL, por sua vez, embora há décadas possua um programa de direita, só ficou em evidência com o advento do bolsonarismo. Agora, depois da fusão com o DEM, formou o União Brasil, tornando-se o maior partido do Brasil.
Nascido há 59 anos, no município de Tarauacá, Luiz Calixto é um apaixonado por política. Na juventude, militou no PMDB e suas posições políticas sempre estiveram no campo progressista. Antes de ser fiscal de renda do estado, devidamente aprovado em concurso público feito pela Escola de Administração Fazendária (Esaf), Calixto quebrou concreto, foi ajudante de pedreiro, pintor de paredes e balconista. Teve sua carteira assinada quando tinha apenas 15 anos de idade.
Iniciou sua carreira política em 1998 quando foi eleito deputado estadual. O então parlamentar, que é formado em Economia pela Universidade Federal do Acre (Ufac), exerceu três mandatos consecutivos, caracterizando-se por suas intervenções qualificadas e naquilo que seria a sua principal marca: a ferrenha oposição aos longevos governos petistas.
Para falar sobre o atual momento político, a reportagem foi até o apartamento dele, localizado no bairro Abraão Alab. Calixto falou sobre a sua militância no PMDB, analisou os governos nas três esferas de poder e contou algumas histórias que a crônica política não registrou. Vejas os principais trechos da entrevista:
AcreNews – Como a política entrou na sua vida?
Luiz Calixto – O meu pai era PMDB. Assim que tomei posse na Sefaz, em 1983, fui removido para Tarauacá. Foi um período muito bom na minha vida, sobretudo porque voltei às minhas origens. Foi nessa época que eu me filiei ao PMDB, atuando ativamente no setor jovem do partido, que era democrático e sintonizado com os anseios da sociedade. O município era isolado e as formas de comunicação eram por cartas e por um aparelho chamado fonia. Telefone era uma coisa muito rara. Eu me considero um progressista, um democrata, um entusiasta do debate e tenho muito respeito pelo contraditório.
AcreNews – Como o senhor conseguiu se eleger deputado estadual em 1998?
Luiz Calixto – Eu sempre tive vontade de ser candidato. O convite foi feito pelo Petecão, então presidente do PMN. Eu pensava tirar uma votação expressiva, porém obtivei 2.246 votos, numa disputa acirradíssima. Depois me reelegi por duas vezes, mas sempre com votações modestas, mesmo porque eu nunca dispus de estrutura financeira.
AcreNews – O senhor poderia ter sido candidato majoritário em 2010, porém preferiu concorrer a mais uma reeleição na Aleac (Assembleia Legislativa do Acre). Foi um erro?
Luiz Calixto – Eu recebi convites para ser candidato ao Senado, mas sempre tive os meus pés plantados no chão. Eu não tinha estrutura partidária ou financeira para tocar uma campanha de senador. Eu não me desfaço de nada que eu consegui na vida para gastar em política. Eu nunca concebi ou concebo a política como um investimento. A deputada Idalina me incentivava para ser candidato a deputado federal. Naquela eleição, o Márcio Bittar tirou mais de 50 mil votos e o Flaviano 36 mil, ou seja, existia uma vontade muito grande das pessoas votarem na oposição. Eu acho que deixei o cavalo passar selado.
AcreNews – Há muito tempo a Aleac se ressente de bons representantes. O senhor, mesmo sem mandato, tornou-se um dos principais defensores do governo. Por que?
Luiz Calixto – O governador nunca me pediu para eu fazer absolutamente nada. Ele já me convidou umas cinco vezes para compor a equipe dele. Eu sempre agradeço e digo que posso ajudá-lo de fora. Não quero ser gestor público e muito menos candidato a mandatos eletivos. Eu sempre vi a política como uma vocação. O único vínculo que tenho com o estado é o serviço público. Muita gente, que teria a obrigação de defender o governo, não faz. Como pessoa, eu dou nota nove para ele. Para a gestão, seis. Mas ele é bem-intencionado. Deste o tempo em que era deputado federal, sempre me tratou bem. Existem algumas pessoas que eu ajudei, que me indispus e até me arrisquei. Elas sequer ligaram pra mim.
AcreNews – Nos idos tempos do PT, instalou-se no Acre um regime tão autoritário e ufanista que nos remete ao Regime Militar, de triste memória. O senhor tem algumas lembranças daquele tempo?
Luiz Calixto – Eu sou e sempre serei contra qualquer espécie de dominação. Uma vez eu fui autenticar um documento no Cartório do Quinze. Na hora que entrei, uma moça disse que gostaria de me ver morto. E eu perguntei: mas por que? E ela respondeu: porque o senhor é contra o Acre. Outra vez, eu estava num estádio de futebol com um comerciante, cujo nome vou omitir, e ele foi indagado por governistas que o questionaram assim: por que você está andando com esse tal de Calixto?
AcreNews – Como o senhor avalia o governo do presidente Jair Bolsonaro?
Luiz Calixto – Ele foi eleito com uma altíssima aprovação. Eu já sabia que seria um desastre porque ele é um homem completamente despreparado. Às vezes eu fico me perguntando o que a população viu nele. Talvez tenha sido o ódio ao PT, que era um exemplo de ética, retidão e compromisso com a população, mas foi uma decepção para o povo brasileiro. O Bolsonaro surgiu, também, com um discurso que agrada um segmento com pautas tipo: liberação de armas, o fim das áreas de conservação e uma política que pode levar à extinção dos povos indígenas. Ele tem um prestígio muito grande com a turma do agronegócio porque faz tudo que eles querem, inclusive liberando inseticidas proibidos em outros países. Isso é tão drástico que um segmento ruralista não quer essas liberações, justamente porque vai acabar com alguns biomas. Como chefe de Estado, basta ver como ele é recepcionado mundo afora. No Congresso Nacional, ele se aliou com quem chamava de ladrão. Por fim, vejam onde ele foi se filiar: no partido do Valdemar da Costa Neto (PL).
AcreNews – Como o senhor avalia a administração do prefeito Bocalom?
Luiz Calixto – O PT dizia que tudo que eles faziam era referência. Aí o Bocalom diz que vai asfaltar todos os ramais de Rio Branco. E não é porque ele não queira. É porque não tem condições. Existe uma distância muito grande entre a vontade e a possibilidade. Ele está pagando pela expectativa que criou. O Bocalom colocou o sarrafo muito alto. Pessoas, do tipo dele, o maior pecado é a autossuficiência. Acham que sabem e podem tudo. Além de Rio Branco ser uma cidade complexa, é preciso ter uma equipe, uma boa relação com a Câmara de Vereadores, bem como com as entidades representativas e a imprensa. O prefeito tem que cuidar dos serviços essenciais como o transporte coletivo, a limpeza e o saneamento básico. Daqui a mais ou menos um ano, o abastecimento d’água em Rio Branco vai ficar caótico, ou seja, será um desastre porque não existem investimentos. O Município, salvo engano, foi a única capital do Brasil a recusar a intervenção do BNDS (que financiaria a iniciativa privada) para que o sistema de água e esgoto fosse privatizado. Aí eu fiquei impressionado, uma vez que o Bocalom é tido como um político de direita. Os Municípios não têm recursos para resolver esse problema. Não adianta você pagar por água e tratamento de esgotos e esses serviços não serem disponibilizados. Isso não passa por questões ideológicas, mas por puro bom senso.
AcreNews – Como o senhor avalia a gestão do governador Gladson Cameli?
Luiz Calixto – Como eu tinha dito antes, eu dou nove para o governador e seis para a administração. Ele começou errado ao fracionar o governo entre os parlamentares. O Rocha tinha muitas secretarias, o Petecão muitos cargos. Na história do Acre, não há registro de um vice-governador com tanto espaço político. O erro dele, por exemplo, foi ceder secretarias para o Flaviano ou o Márcio e dizerem: isso não é do MDB. Eu conheci uma situação onde o nomeado se reportava ao padrinho dele e não ao governador. O senador Petecão, que sempre foi da Frente Popular, não tinha 10% do espaço que ele tinha neste governo. Mesmo assim, esse pessoal decidiu que o Gladson não poderia ser candidato à reeleição. Depois veio a pandemia, que atrapalhou bastante, mas ele se saiu muito bem, inclusive isso criou divergências com o presidente Bolsonaro. Uma das maiores virtudes do Gladson é a liberdade. Não há registro de que ele interferiu na linha editorial dos veículos de comunicação. Outro problema do governo é a falta de interlocutores. A relação direta do Gladson com as pessoas acaba tirando a autonomia dos secretários e sobrecarregando ele.
AcreNews – O senhor acredita que o governador pode se reeleger?
Luiz Calixto – No primeiro turno. Primeiro porque ele tem uma empatia muito grande com a população. Depois, porque não é uma pessoa arrogante. O Gladson recua, repensa. Além do carisma, não usa o poder do Estado para perseguir ou oprimir ninguém. Ele teve um desempenho satisfatório durante a pandemia. Não há registros de que um acreano morreu por falta de assistência. Ele foi solidário, humano. Outro fator é que os adversários deles são muito ruins.